06/08/09

Quero Conversar Consigo

Com a usual dificuldade que a pouca mobilidade que ainda tem nas mãos lhe permite, escreveu na página de word sempre aberta e que vai sendo apagada à medida que precisa de escrever mais, “quero conversar consigo”. Virou as costas e foi para a varanda cheia de sol, talvez para não ver a perplexidade que eventualmente se estampasse na minha cara. Segui-o e perguntei se tinha alguma coisa especial que me quisesse dizer ou sobre a qual quisesse falar. Fez que não com a cabeça e olhou em frente com um ar determinado, à espera que eu “conversasse”. Balbuciei umas banalidades sobre o Tejo que se conseguia ver por cima dos telhados das casas do bairro, ele assentiu, mas sem olhar para mim. Depois demorei-me um pouco mais a comentar a casa da frente grande e com jardim que parece albergar várias famílias. Com um gesto do queixo fez-me ver quatro garagens cujas entradas ficavam em frente à sua casa e percebi que eram quatro as famílias. Então lembrei-me de lhe perguntar há quanto tempo vivia naquela casa. Ainda não tinha terminado a frase e já ele, com o passo rápido entrava novamente na sala para escrever, devagar, no computador “8 anos”. Assim começou a nossa conversa ao ritmo desajeitado, mas voluntarioso, com que, entre assentimentos de cabeça e outras perguntas minhas, ia escrevendo uma frase após a outra.
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