15/03/08

Há dias assim,

como o de ontem, em que se chega tarde a casa e, em reflexo condicionado, se liga a televisão para tentar perceber se durante o alheamento informativo que às vezes são os dias, alguma coisa aconteceu. Em vez disso entramos em choque e perguntamo-nos onde estamos, se por acaso nalguma esquina entre luzes de semáforos não nos desviamos do nosso caminho e se não teremos entrado numa outra dimensão deste mundo. Fiquei assim vendo a SIC entre as notícias sobre a proibição dos piercings de acordo com uma tabela qualquer pensada por especialista (certamente) e regulamentação de tatuagens e a reportagem sobre Luis Filipe Menezes na intimidade. Proibir piercings? Mas quem é que vai fiscalizar essa legislação se ela algum dia existir? Numa sociedade onde há salas de chuto, onde se pode abortar legalmente até às 10 semanas, como é que estes legisladores e têm a arrogância de pensar que algum dia podem regulamentar esta actividade de piercings e tatuagens? Pior, como é que lhes passa pela cabeça que isso é importante? Quem lhes disse que era necessária regulamentação dessa área? Quem neste governo sofre de esquizofrenia legislativa e de hiperactividade regulamentar? Estão todos doidos? Já agora, informem-nos por favor sobre o que é que se propõem regulamentar a seguir, uma vez que a noção de liberdade individual lhes é totalmente alheia.

Ainda mal refeita dos piercings na língua e restante cavidade oral, vejo a reportagem sobre o líder da oposição “na intimidade”. Eu que cada vez percebo menos de política e que cada vez entendo menos seja o que for sobre agências de comunicação (e o mundo em geral, diga-se), tento o mais possível não perder o bom senso do meu horizonte. Aquela reportagem não tem ponta por onde se lhe pegue. Será que alguém depois de ter visto Luís Filipe Menezes em toda a sua glória intimista, quer um homem assim para primeiro-ministro? Se a reportagem de José Sócrates foi ensaiada e falsamente natural com as já famosas referências às leituras dos filósofos espanhóis, e o telefonema a Zapatero, pelo menos foi pensada para poder contornar a ratoeira que a “intimidade” tanta vezes se revela ser. José Sócrates não se expôs muito, e bem, a reportagem não acrescentou nada, pior para a SIC que gastou recursos nesse projecto. O caso Luís Filipe Menezes foi pior para o próprio: a sua intimidade foi uma ratoeira em que não se entende como é que ele caiu. Os seus conselheiros e as célebres agências estavam onde? Mostrou uma casa sem alma, um restaurante banal, um barbeiro a despropósito, um hotel em Lisboa, que não deram propriamente uma imagem de solidez. Uma exagerada exposição de filhos, pais e namorada que falando de LFM também em nada contribuiram, apesar da boa vontade, para uma acrescida consistência e coerência à figura do líder da oposição. Também o discurso de LFM se enche de contradições mesmo a falar de coisas simples e banais como foi sobre o seu principal defeito (a jornalista perguntou isso). Ideias políticas também não passaram e a vacuidade foi confrangedora. Não gostei especialmente da jornalista que nem no caso de José Sócrates nem no de Luís Filipe Menezes conseguiu passar da trivialidade. Nunca fez perguntas interessantes que permitissem aos entrevistados brilhar um pouco. Nos momentos em que isso aconteceu (com JS) foi porque o entrevistado se impôs. Como trabalho jornalístico também achei as reportagens fracas.

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