18/09/08

Da Culpa 2

Quem lê este blogue sabe da pouca simpatia e, nalguns casos, da relativa indiferença aqui manifestada pelas chamadas “causas fracturantes”. Em relação à nova lei do divórcio no entanto, acompanho a linha do governo. Talvez por motivos distintos pois o governo, na onda fracturante em quer sobretudo piscar o olho a uma certa esquerda de causas, vai facilitar a vida a quem se quer divorciar “unilateralmente”. Mas, como diz o provérbio, se “quando um não quer, dois não brigam”, em última análise também se poderá dizer que “quando um não quer, dois não continuam casados”. Parece ser um facto da vida. Ponto. Não querendo cair no pano de fundo facilitista e relativista que de mansinho se vai instalando nas nossas sociedades com estas causas mais radicais, gosto desta nova lei. Gosto que o Estado não seja zelador dos problemas amorosos, por excesso ou defeito, dos cidadão, nem tão pouco dos seus dilemas morais de quebras de promessas, ou mesmo religiosos no caso do catolicismo (o mais comum) pelos dilemas sacramentais (o matrimónio é um sacramento, lembro), gosto por isso que o Estado seja pragmático permitindo e legislando eficazmente o que é hoje um facto normal e um acto corrente: o divórcio. Claro que é importante proteger o lado mais fraco, palavras subtis que querem dizer simplesmente a pessoa que menos recursos financeiros tem e cuja dependência financeira do outro é maior, normalmente a mulher que abdica de uma carreira mais ambiciosa e agressiva para ter disponibilidade para a família: o marido e os filhos. Noções como “culpa” ou “divórcio litigioso” (que em última análise é já um pleonasmo) não deviam fazer parte do léxico jurídico do divórcio no séc. XXI. Nunca vi que a culpa e que os longos divórcios litigiosos trouxessem proveito a seja quem for que directa ou indirectamente (os filhos) esteja envolvido em tal processo. Vejo, vemos todos, exemplos suficientes do que disse e vejo, vemos todos, os filhos de casais que se divorciam litigiosamente entre argumentos de “culpa”, insinuações e acusações mútuas em que mais não se descobre do que a miséria humana por todos partilhada, respirarem um ar pouco sadio feito de ressentimentos e acabarem tantas vezes como instrumentos de arremesso de um progenitor ao outro. Acabar com “culpas” e litígios talvez seja um começo para um ar menos podre entre quem se divorcia.

Nunca até hoje eu percebi que a parte mais fraca fosse protegida pela lei existente com a sua culpa e com o seu litígio. Mais do que uma lei, é uma mentalidade que se tem que mudar, é a necessidade de instituir rotinas de negociação de acordos bem como fiscalização do cumprimento dos mesmos. Os males do coração só o tempo poderá curar, não cabe ao Estado punir quem parte corações, deixa de sonhar no futuro a dois, trai expectativas ou fere orgulho, assim como não cabe ao Estado emendar corações partidos ou reparar ilusões desfeitas, mas cabe-lhe zelar para que as partes mais fracas tenham os meios justos para viverem com a dignidade com que viviam. Quem quebra contratos indemniza. Salvaguardar este aspecto é o maior contributo para que tantas e tantas mulheres não se vejam numa situação financeira alarmante para o resto das suas vidas e para que tantas deixem de criar sozinhas filhos anos ,quantas vezes sem contributo financeiro de ex-maridos, e processos no tribunal de família que nada conseguem fazer.

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