Depois de ouvir o excerto da entrevista do Primeiro-ministro à Bloomberg na segunda-feira (ouvir
aqui), fiquei com o “maneuvre space” no ouvido, bem como com aquele “ó” bem aberto em “governement” que, por motivos diferentes (o sotaque pouco rodado e as expressões marteladas), falam da pouca fluência e convivência de Passos Coelho com a língua inglesa. José Sócrates era também assim, para pior, pois à ignorância acrescentava uma falsa intimidade com a língua. PC o aluno média com ar aplicado, JS o espertalhão desenrascado que arranjou um short-cut na sua aprendizagem: o inglês técnico.
Pensei então em como Cavaco Silva fala Inglês, com fluência e à vontade. Pensei em António Guterres e Durão Barroso quando Primeiros-ministros que também falavam bem inglês (agora falam ainda melhor), e claro, Jorge Sampaio que fala muito bem como seria de esperar. No fundo a capacidade de falar ou não bem inglês seria irrelevante – em última análise fazê-lo não é obrigatório num país de língua portuguesa - se não fosse um sinal; sinal esse que me leva a uma reflexão sobre a escolaridade e o percurso académico dos nossos últimos PMs, versus a escolaridade e o percurso académico dos anteriores. Cavaco Silva, António Guterres e Durão Barroso tiveram uma escolaridade normal, nomeadamente no que se refere a idades e prazos que foram os esperados; e tiveram percursos académicos, frequentando, também na idade esperada, cursos superiores em universidades do estado, com aproveitamento acima da média, apesar do já então envolvimento político de DB e de AG. Não vale a pena alongar-me sobre o curriculum académico destes políticos (qualquer consulta online nos esclarece), para que se perceba de imediato a enorme diferença que separa, em termos de solidez de formação académica, esses políticos dos que conhecemos nos últimos anos.
Se isso tem influência no tipo de políticos que são, na qualidade do que pensam e de como pensam? Tem. Tem muita, e normalmente nota-se mais no ‘como pensam’ do que no ‘o que pensam’. A falta de um curriculum académico rigoroso e sólido – ou em alternativa, um percurso profissional exigente e feito com esforço – são características de José Sócrates e Passos Coelho, que acabam por marcar todos os aspectos da sua actividade política e que não deixam de ser detectados por alguém exigente para além do óbvio, sendo o óbvio hoje qualquer versão de “mas Passos Coelho é muito melhor do que José Sócrates”. Não quero, nem serei eu a desmentir esse lugar comum actual, mas confesso o pouco consolo que ele me dá quando olho aquilo que considero a fragilidade/ausência do projecto político do governo que vai governando certinho, rigoroso e de acordo com todas as regras que nos impõem, mas sem visão nem ousadia políticas.