Revi ontem num canal de televisão, um dos filmes dos anos oitenta de que mais gostei na altura: Witness de Peter Weir. É sempre com apreensão que revejo filmes de que gostei e após um longo período sem os ver porque tenho sempre medo de me desiludir, de achar que o filme está datado e irrelevante, que perdeu algum edge. Não foi o caso. É um thriller que nos prende, que tem a sua dose de crueza própria de histórias de corrupção, mas isento de violência gratuita e que por isso não nos põe os cabelos de pé, pelo contrário remete-nos para a nostalgia de um sonho de utopia, de sociedade perfeita sem “maus”, tal como a teríamos sonhado num momento na infância. É, sem lamechices, uma alusão, um reconhecimento ou mesmo uma homenagem a esse tal sonho que existirá e sobreviverá num limbo qualquer da nossa condição humana. A cena mais emblemática desta homenagem é a construção do celeiro do casal recente. Mas o filme não se perde em utopias e depressa se entra no trilho realista, mesmo contando com o anacronismo da comunidade Amish, como o prova a história de amor – paixão, desejo, o que for - que desde o início injecta a narrativa de uma forte carga erótica. A cena da música no carro do celeiro é um dos pontos de maior tensão que ilustra este erotismo nunca óbvio mas sempre presente. Harrison Ford continua credível no seu papel como John Book, e Kelly Mc Gillis tem aqui talvez o momento mais alto da sua carreira. Pena que nunca mais a tenhamos visto. Acho que Witness entrará - se é que não entrou já, na galeria dos "clássicos".
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, (...) E, afora este mudar-se cada dia, Outra mudança faz de mor espanto: Que não se muda já como soía.
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