Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, (...) E, afora este mudar-se cada dia, Outra mudança faz de mor espanto: Que não se muda já como soía.
26/11/18
Avanços
Limito-me a registar a facilidade com que se fala de civilização e de avanço civilizacional a propósito de qualquer coisa. Há umas semanas foi a Ministra da Cultura que – no parlamento – disse com muita clareza que as touradas eram uma actividade humana que cada vez fazia menos sentido (palavras minhas) numa civilização que se quer avançar. Esta noção de movimento – os ditos avanços e recuos civilizacionais – intriga-me. As civilizações evoluem e penalizar/acabar com touradas é uma opção acertada para estarmos no lado certo do dito avanço civilizacional.
Quero deter-me um pouco nesse avanço, nesse movimento que, característica intrínseca do movimento, há-de ter uma direcção. Ora ninguém me explica qual a direcção dos ditos avanços civilizacionais que prometem, e que deveríamos alegremente e sem pestanejar construir. Eu gosto de perceber as coisas e nunca percebo que tipo de civilização ‘óptima’ é essa que devemos almejar, abandonando práticas consideradas não civilizacionais como as touradas. Afinal, quem é que nos explica que tipo de civilização é essa? Será que a ministra da Cultura sabe onde é que esse avanço civilizacional nos leva? Ou será que essa dita civilização que os avanços nos permitem vislumbrar não é mais do que um work in progress (este conceito que está na moda) de uma agenda política que existe na cabeça de uma minoria normalmente elitista e ‘de esquerda’ que impõe os novos códigos morais inventados numa máquina de propaganda qualquer num gabinete de marketing político e assentes em restritivos códigos de linguagem politicamente correcta? As pessoas que fazem a maioria – essa coisa chata e inconveniente que vota ‘populista’, Trump, Brexit, entre outros - pouco se revê nesses novos códigos morais, na linguagem cuidada, vigiada e reprimida e nessa ânsia de ‘avanço civilizacional’. Agora foi a tourada, em breve arranjarão outro tema para nos falarem de civilização. Deveriam parar um pouco, olhar à volta, e ver onde param os avanços civilizacionais, por exemplo (poderia dar tantos), num programa de televisão que se chama “Casados à Primeira Vista”, um reality-show pseudo-científico e com ‘Especialistas’ a funcionarem como casamenteiras. A tourada é, em todos os aspectos, infinitamente mais interessante e superior do ponto de vista civilizacional (e eu não sou propriamente uma apreciadora de touradas).
Na minha noção de civilização os avanços civilizacionais prendem-se com (e para não me deter num passado muito passado, começo no século XVIII) a abolição da escravatura, o voto das mulheres, a diminuição da taxa de mortalidade infantil, a educação para todos, o aumento do número de sociedades democráticas, e o aumento da média da esperança de vida, para citar alguns. Infelizmente, no nosso planeta Terra e nos dias de hoje muitos destes avanços civilizacionais estão por cumprir. Mas isso não incomoda quem, nas nossas sociedades chamadas ocidentais tem uma agenda política politicamente correcta. Nem isso nem o simples facto de que na nossa própria sociedade aguardamos ainda o cumprimento de um avanço civilizacional importante: uma Justiça célere, eficaz e ao alcance de todos. Mas isto sou eu a falar ... quero lá saber das touradas.
23/03/13
Se Tivermos Sorte, Chegamos a Velhos
22/11/12
Dando Excessivamente Sobre o Mar (Edição Especial)
18/11/11
"Esta Ridícula Ilusão que em Portugal se Chama Teatro"
17/11/11

24/07/10
Middlemarch
14/07/10

21/04/09
Da Cultura
AMF e VGM falavam com uma voz tranquila e baixa, opinavam, teciam relações, encontravam referências, ajustavam ideias e nada era complicado, obscuro ou rebuscado, só transparecia a simplicidade de quem se deixa levar pelo verdadeiro prazer da leitura de cada uma das obras, a vontade de mostrar os caminhos que elas abrem, de pousar o olhar de uma ou de outra forma. Foi bom relembrar umas, querer ler outras e sobretudo foi bom tentar perceber porque se perde tanto tempo a ler tralha e mais tralha com tanta boa literatura que passou o teste do tempo e das modas a merecer ser (re)descoberta e desvendada. O paraíso poderia (também) ser algo parecido com aquilo. As poucas interrupções e gargalhadas de Paula Moura Pinheiro destoavam um pouco, não tanto pelo conteúdo, mas pela forma pois quebrava o ritmo e o tom que os convidados impuseram ao programa. Mas pior do que isso foram as ruidosas interrupções, sem aviso e no meio da conversa, de pura propaganda “cultural” a filmes, temporadas musicais ou concertos. Porque é que era preciso aquilo? Não é mais importante para a “cultura” saber passar o prazer de a usufruir do que cansar-nos com a lista exaustiva daquilo que vai acontecer, e que já todos tivemos oportunidade de ver e ler nos jornais e nos cartazes espalhados pelas cidades?
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18/05/08
Torre de Belém
Num primeiro momento fiquei intrigada, ali de pé na varanda a olhar ao longe a Torre de Belém, mas não perdi um segundo mais a pensar nisso. Depois quando vi que a bizarria persistia, e porque não tinha passado por lá, tentei perceber o que era e muni-me de binóculos de longo alcance e telescópio. O quê? Bolas plásticas enormes das que parecem marcar rios e mares a enfeitarem a Torre de Belém, qual pescoço com colar étnico para festa popular? Tive que passar por lá para confirmar o adereço, e senti dificuldade em focar os olhos, a mente e sobretudo o gosto e a sensibilidade estética. A Torre de Belém está horrorosa, pior do que isso, está pirosa. Um monumento que não sendo propriamente o Mosteiro de Alcobaça mas que é, na sua simplicidade, digno, sólido, de linhas bonitas, e carregado de história e simbolismo nomeadamente por ser o ex-libris da cidade de Lisboa, e que é nosso património – é meu e de todos os portugueses, não pode ser objecto de experiências decorativas sem nexo nem gosto e que vilipendiam a sua dignidade, por muito interessante que possa ser o pretexto, coisa que desde já duvido, mas fica feita a salvaguarda. Será que ninguém pensa, nos serviços da cultura e do património?
Há uns tempos falava-se em promover o Turismo Cultural em Portugal (a propósito do S. Carlos, por exemplo). Não é assim com iniciativas pindéricas que mais não fazem do que retirar a dignidade arquitectónica histórica e simbólica do monumento que se promove o dito turismo cultural, nem sequer o turismo normal (se alguém entender a subtil diferença existente nas cabeças dos governantes que fazem planos e nos promovem a West Coast of Europe, que eu não entendo) que em Lisboa vive de meia dúzia de monumentos, trajectos e referências. E muito sol, muita luz, muitas sardinhas.
Por favor, voltem a dar à Torre de Belém a dignidade que ela merece.
03/09/07
A Espuma dos Dias que foram 2
Lembro-me de durante as férias ter ouvido falar de:
Luta interna no BCP. Confesso que prestei pouca atenção a estes episódios finais, mas não sei porquê fiquei a admirar mais Belmiro de Azevedo e reforcei a minha convicção de que ele é o que mais próximo existe em Portugal de um verdadeiro empresário, independente do regime, do centrão e muitas vezes até apesar de e contra o Estado. Não gostei desta novela BCP, talvez por ser um espelho demasiado fiel da nossa realidade/mentalidade portuguesa.
Entrega de computadores pela mão do Primeiro-ministro algures aqui no nosso país. A notícia provoca náusea pela falta de imaginação deste enredo e consequente previsibilidade; pelo simbolismo bacoco, paternalista e provinciano do gesto (no Estado Novo fazia-se melhor?) que a repetição expõe sem dó. Revolta por nos tomarem por parvos.
Deboche. Apurei o ouvido, interessei-me, fiz uma nota mental para posteriormente tentar perceber do que se tratava. Assim fiz e a desilusão foi total. Nem com “deboche” Portugal aquece.
Eduardo Prado Coelho. Lia às vezes as suas crónicas que ora me irritavam (a grande parte das vezes), com o seu exibicionismo intelectual as inúmeras citações, as frases incompreensíveis, o preconceito e o azedume, ora me divertiam com o seu olhar particular sobre o mundo, o humor, a ironia, a bonomia e a sua, tantas vezes, boa escrita. Era culto e gostava de exibir a sua cultura. Era uma figura presente e agora é ausente. A doença, nossa e dos outros, ameniza-nos porque sabemos que perante ela todos estamos desprotegidos e sós. E sós deixamos este mundo.
Red Bull Air Race. Tenho pena de não ter visto. Teria tido a sua dose de emoção, estou certa.
Furação Dean e portugueses de férias nas Caraíbas. Voltarei em breve a este assunto.
14/03/07
Basta!
Num Portugal como o nosso feito de pequenez, habituei-me a sorrir da idiotice, do golpe e do provincianismo pomposo que abundam e espreitam por qualquer canto, de preferência mal iluminado. Mas há alturas em que pequenas coisas, por exemplo, frases feitas pelos especialistas de marketing, ou pelos psicólogos sociais, gurus de tanto quadro de chefia e político nacional, me irritam demais e impelem a dizer “basta!”. Basta de me tomarem por parva. Pago os meus impostos, poupo água, apago as luzes, não deito pastilhas elásticas para os passeios, voto sempre, gabo as belezas naturais (as que ainda existem) do meu país, sou de um comportamento cívico exemplar, por isso revolto-me com a ofensa diária que sobretudo os políticos fazem de sistematicamente me tomarem por parva. Ele é o “Cartão do Cidadão” que nunca servirá para que se cruzem dados abusivamente, ele são os SISIs, ele são os novos preços dos medicamentos, os novos impostos automóveis (em que o contribuinte acaba sempre a pagar mais), a OTA, enfim poderia continuar mas poupo esse esforço.
Desde ontem que uma expressão, a propósito do afastamento de Paolo Pinamonti do Teatro Nacional de S. Carlos, não me sai da cabeça pela estupidez - e cupidez (?), enfim, todo um tratado do pior que há no nosso país - que encerra: “Turismo Cultural”. Oh Deus! Que é isso? Até hoje turismo cultural têm sido uns viras corridos dançados no Algarve para turista ver, ou um passeio até aos Jerónimos, o Castelo de S. Jorge (que só tem a vista como recompensa para tão grande subida), alguns turistas mais exigentes vão ao Museu Nacional de Arte Antiga, e no norte o turismo cultural resume-se numa ida a Gaia às caves do vinho do Porto beber uns copos à borla, e um passeio pela Ribeira de guia na mão a tentar perceber o que é que é suposto não deixar de ver e apreciar. Esta gente julga o quê? Que Setúbal é Salzburgo? Viana do Castelo é Antuérpia? Que Lisboa é Viena? O Porto é Milão? Braga é Praga? Coimbra é Heidelberga? Évora é Nápoles? E Faro Barcelona? Já nem falei de Londres, Paris, Nova Iorque, Roma, Berlim, Madrid, Amsterdão...
Há uns anos chamaram cá (Cavaco Silva, o então PM) Michael Porter, o economista guru das Vantagens Competitivas das Nações para que elaborasse um relatório sobre as vantagens competitivas de Portugal. Claro que se pagou o relatório, que foi rapidamente engavetado e poucos políticos decisores o devem ter lido com alguma atenção crítica. Na altura da apresentação das conclusões lembro-me de se ter falado em alguns “clusters” para Portugal, nomeadamente o vinho, o turismo, cortiça. Será que este governo nas pessoas do Primeiro Ministro da Ministra da Cultura e do Secretário de Estado, estarão com vontade de repescar o “cluster” do turismo alargando e expandindo o seu âmbito em dimensões nunca anteriormente sonhadas? Se sim, desenganem-se, pois salvo uma pequeníssima minoria, ninguém vem a Portugal pela cultura. Vêm pelo clima, (que também é o que nos prende tanto cá) vêm pelo sol, pelo golfe, pela comida pelos friendly locals, mas pela cultura? Desenganem-se: a produção do S. Carlos, da Gulbenkian, da Casa da Música é para nós portugueses que vivemos cá e que não vamos (pelo menos como regra) ao Metropolitam, ao Scala, a Covent Garden ou à Opera Garnier (ou à Bastille). Se o que nos oferecerem esgota as salas é sinal que o mercado, sem turistas, aguenta mais oferta: ofereçam então que a procura é maior!
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