30/06/11

Imperdível este post de Luís M. Jorge no Vida Breve (já agora é de ler o anterior também). Já me fez rir logo de manhã. Se não for rir, fazemos o quê? Se nós, contribuintes, soubéssemos toda a verdade sobre cada coisa que pagamos com o nosso dinheiro, corríamos o risco de ‘morrer de riso’.

A propósito da RTP, RDP, Lusa e afins, continuo sem perceber muito bem de que é que falam quando se fala em “serviço público”. Parece que ainda não decidiram o que ele deve ser. Eu sei o que gostaria que fosse, (e deter uma central de informações não é com certeza), mas não vejo nenhum político debater seriamente a questão do serviço público, e o que é relevante ou não caber nesse conceito. Aliás falar em privatizar a RTP – que afinal não é a RTP1, mas sim um canal da RTP (qual a RTP2? A RTPN? A RTP Memória? A RTP África?), sem definir o que é serviço público e como é que ele poderá ser prestado, é – mais uma vez – pôr o carro à frente dos bois, ou ceder à política do anúncio de medidas, sem saber muito bem os ‘como’. Ou então privatiza-se um canal qualquer que não seja a RTP1, restruturam-se uns serviços, poupam-se uns tostões, mas fica tudo muito igual, seguindo aquela máxima de que é preciso mudar para que tudo fique na mesma.

Ler também aqui.

26/06/11

Coisas que se Podem Fazer ao Domingo 62

Mexico (600-900)


Mas que raio estou aqui a fazer?
Está eleita a frase do dia: "Usem protector solar". A frase foi pronunciada por António Costa num avisado conselho aos ciclistas que participem na manifestação de hoje com um mobilizador e inspiradíssimo tema: "Pedala o mais nu que conseguires".

22/06/11

O Preço da Demagogia

Lamento que o novo Primeiro-ministro, em absoluto estado de graça e merecendo um quase unânime louvor por cada “ai” que lhe sai da boca (excepção feita aos PS ainda mal refeitos do fim do socratismo), não perceba a diferença entre Pedro Passos Coelho e o Primeiro-ministro. As conversas/promessas de chacha e respectiva decisão de trocar os bilhetes de classe executiva para classe económica (os senhores jornalistas, não querem ver quanto tempo dura esta decisão, por favor?) não só não me convencem – da sua utilidade, claro - como me irritam. Eu quero o meu Primeiro-ministro, no exercício da sua alta função de estado, a fazê-lo com a dignidade que o cargo exige. Nem mais, nem menos.

Eu quero que o Primeiro-ministro use as salas VIP, que viaje em conforto e discrição em classe executiva, que tenha atenção à sua segurança, e que honre aqueles que representa. Não o quero a fazer bicha para ir à casa de banho, a lutar por um lugarzinho no compartimento por cima dos assentos para o seu sobretudo, nem a desembrulhar a sanduíche 'ranhosa' fria e seca que é oferecida neste tipo de voo, enquanto tenta perceber a melhor forma de colocar as pernas para baixar o tabuleiro. Não quero que vejam, fotografem, filmem e postem na internet o seu momento a 'passar pelas brasas', ou até (eventualmente) o seu ressonar. Não é pedido isso a um Primeiro-ministro, nem em tempo de crise. Não é essa "poupança" que é relevante e o gesto simbólico de "falsa igualdade" é mau, muito mau.

Por favor, não comecem a fazer de nós parvos como José Sócrates fazia. Concentrem-se no que é importante, que já é muito - tal o legado do governo anterior - e para o qual precisam de toda a energia, coragem e trabalho. E poupem-nos a demagogia de encher o olho, por favor.

21/06/11

Velas 29

Domingo

14/06/11

Outra Vez Camilo 3 (Os Homens)

O mundo maioritariamente rural de Camilo nas Novelas do Minho não é só habitado por mulheres e, da mesma forma que Camilo cria personagens femininas densas e complexas, também o faz com as personagens masculinas. Os homens não escapam à lupa tantas vezes irónica (repito-me) de Camilo que aumenta alguns dos seus traços ao ponto de quase desenhar caricaturas.

Assim mesmo, o pedreiro, se tinha muitas maldades de avarento, possuía também algumas belas qualidades de pai; e uma, digna de bastante memória, é que, tendo ele em casa arsénico para matar ratos, não o administrou ao filho.
Camilo Castelo Branco, As Novelas do Minho, Volume 1, A Morgada de Romariz

Quando entraram no quinteiro, saía o lavrador da adega, onde pela terceira vez fora matar o bicho, aquela hidra de Lerna que botava cabeças todo o santo dia no bucho hercúleo de João da Lage.
Camilo Castelo Branco, As Novelas do Minho, Volume 2, Maria Moisés

Nestes dois excertos encontramos exemplos do lavrador, sem instrução ou cultura, que trabalha, melhor ou pior e que, melhor ou pior, vai sustentando a família. É muitas vezes bronco, às vezes bruto. Mas há mais...

Camilo perdoa as fraquezas do coração e da paixão e observa os apaixonados, homens e mulheres, sem preconceito e até com simpatia. Mas mostra nas novelas pouca compaixão pelas suas personagens masculinas quando elas, cegas pela ambição se deixam guiar por motivos mercenários, ou quando, por imaturidade, leviandade e prepotência, se mostram inconsequentes e irresponsáveis nos seus actos.

Corridos dois anos de vida bem comportada, foi admitido em uma sociedade de carvoaria de sobro, por onde lhe seria possível readquirir os bens esbanjados: mas, apenas a fortuna lhe sorriu, a sua índole brava sopeada pela pobreza, partiu as algemas, e tornou às antigas proezas e ribaldarias com o femeaço.
Camilo Castelo Branco, As Novelas do Minho, Volume 3, O Degredado

Ainda assim o estreme espírito português, por mais que o afiem e agucem, é sempre rombo e lerdo: não se emancipa da velha escola das farças: é chalaça.
Camilo Castelo Branco, As Novelas do Minho, Volume 1, Gracejos que Matam

Neste mosaico de personagens que, para facilitar a feitura destas notas, tentei ‘categorizar’ há um tipo omnipresente que não podemos esquecer: o fidalgo.

Um dos mancebos mais completos por património, nascimento e gentileza, no concelho de Celorico era o fidalgo de Agilde (...). Se eu tivesse de ir, ao arrepio, na peugada genealógica deste sujeito, encontrava-me com o macaco de Darwin. É família muito antiga a dos Marramaques, - são anteriores à história e talvez aos macacos. E, se me não falha a conta dos avós apurados nesta linhagem, o dilúvio universal está desmentido.
Camilo Castelo Branco, As Novelas do Minho, Volume 2, O Filho Natural

Camilo tem especial afecto pelos fidalgos, mesmo quando é trocista, sarcástico, implacável e mesmo quando lhes descobre – e não perdoa, literariamente falando, claro - más intenções, maus instintos, maus fígados. Camilo gosta e demora-se a explicar genealogias e pertenças (as terras, os solares) sem que detalhe algum falte ao leitor. Esta parcialidade pela fidalguia de província e conservadora (o contacto destes fidalgos com as cidades, sobretudo Lisboa, é sempre interessante, quando não divertido) e o cuidado com que conta a história das famílias e locais são um dos sinais da índole conservadora de Camilo Castelo Branco.

13/06/11

Dias de Verão 22

David Bates
String of Sheepsheads

12/06/11

António Barreto já ‘anda por aí’ há muito tempo, em programas de opinião televisivos, em crónicas no Público e noutras variadas formas de intervenção política. Todos, os que se dão ao trabalho de o ler e ouvir, claro, conhecemos a sua forma de pensar, que nos foi revelando ao longo dos tempos nomeadamente no Cavaquismo e no Guterrismo. Todos lhe conhecemos o seu gosto pela liberdade bebida num meio anglo-saxónico, a sua preferência pelo parlamentarismo, o seu espírito de observação, o seu normalmente oportuno cepticismo, o seu trabalho. Barreto é um homem influente, sim. Eu gosto de o ler e aprecio a sua opinião, sim. Mas este recente deslumbramento por tudo o que ele diz ou faz é de um ‘novo riquismo’ que me espanta. Porquê agora ele se torna tão interessante? Porque não há 5 anos atrás, ou há 8 ou há 11?

Também ouvi o seu discurso, que é bom, mas confesso não ter descoberto nele nada que mereça deslumbramento. Mas eu já ‘descobri’ António Barreto há muito, verdade seja dita, e já vou conhecendo a sua forma de pensar, as suas prioridades, o seu estilo. O seu discurso, ouvido, até me pareceu longo, pois Barreto escreve melhor do que fala. Mas não esperava aquele final que Vasco Pulido Valente hoje no Público descreve, com piada, como uma “longa fuga lírica e tremelicante” (*). É uma visão, eu – por razões que só o meu subconsciente deve conhecer – ao ouvi-lo a tratar Portugal por ‘tu’ numa informalidade forçada, lembrei os profissionais dos call-centres que, numa terra de ninguém entre o tratamento formal e a informalidade abusada, insistem em nos tratar por senhor(a) seguido do primeiro nome: de repente somos todos senhora Sofia ou senhor Pedro, assim numa coisa sem jeito de coisa nenhuma. Também eu já vi finais mais felizes.

(*) Via Portugal dos Pequeninos. O João Gonçalves está de parabéns por o alimentar, para nosso proveito, há oito anos.

08/06/11

The One Less Travelled 3

06/06/11

Dos Pepinos


Considero inaceitável a forma com que a Alemanha lidou com a crise E. Coli. Sem exames científicos que o comprovassem apontaram o dedo aos pepinos espanhóis tendo criado um movimento de rejeição aos legumes frescos espanhóis – ao qual Portugal não escapou – nomeadamente pepinos e tomates que terá custos elevadíssimos. Quer a Espanha quer Portugal têm já problemas que cheguem, e o que menos precisavam era que a Alemanha, levianamente, (ou haverá uma ‘agenda oculta’?) tivesse apontado o dedo aos produtos espanhóis criando uma onda de pânico que afastou os consumidores desses produtos. Confesso que nunca percebi o porquê de, estando a epidemia (e infelizmente mortes) localizada no norte da Alemanha, ou em pessoas que lá tenham estado, se culparem tão prontamente os pepinos espanhóis. Presumo que os ditos pepinos sejam consumidos noutros locais e noutros países que não o norte da Alemanha. Com que autoridade e como é que se faz uma acusação destas? Ninguém levanta esta questão? Hoje já se dizia, para depois desdizer que eram rebentos de soja de uma quinta perto de Hamburgo. Não era melhor calarem-se, antes de ter certezas?

A origem da epidemia não está ainda determinada, mas a UE já diz que proporá compensações financeiras para os produtores afectados pela crise de confiança dos consumidores. Apetece perguntar: não deveria ser a Alemanha a pagar?
Joseph Glasco
Untitled

Frases Soltas.

Sócrates foi corrido pelos eleitores. Foi derrotado um estilo falso, promiíscuo, irreal e cheio de inverdades. Foi derrotada a política das causas, as causas fracturantes, e Sérgio Sousa Pinto. O Magalhães foi derrotado. Sócrates foi corrido pelo PS. O PS – era só olhar-lhes para as caras enquanto batiam palmas com lágrima de crocodilo ao canto do olho – já enterrou Sócrates. Faz-me (ainda) confusão que se passe de bestial a besta (palavras de um treinador de futebol, não é?) num segundo e sem um mínimo de período de nojo. Sócrates já era. Os resultados nos Açores são um consolo, César e Ricardo Rodrigues estavam a pedi-las. Pedro Silva Pereira será substituído por Miguel Relvas. O partido do vazio ideológico e do vazio político em crosta de slogans politicamente correctos também desabou. Foi um prazer ver Loução sem saber o que dizer. A ‘normalidade’ de Passos Coelho convenceu e venceu o suficiente, mas que não se iluda. Passos Coelho vai precisar de muito mais do que normalidade para a função de Primeiro-ministro, e a Fenomenologia do Ser de Sartre não vai ajudar. Trabalho ajuda e quero confiar que PPC trabalhe. Uma boa equipa também, e quero confiar que haja uma. Seriedade e honestidade com os eleitores também, e quero confiar que a cultive. Um bom bocado de sorte, também. Eu desejo-lhe tudo isso, por mim, pelo país e finalmente por ele.

05/06/11

Ao contrário do que ouvi a alguns comentadores, eu não gostei do discurso de José Sócrates. Foi longo, chato, mas sobretudo demasiado estudado ao ponto de, tal como afinal é hábito nos seus discursos, soar a falso. A ‘dignidade’ de que os ditos comentadores falaram e que elogiaram, não me pareceu nada mais do que uma pose preparada para sair de cabeça tão erguida quanto possível do seu desaire eleitoral. A aparente sinceridade – aquele ‘abrir o coração’ em que ele diz ter-se sentido honrado por servir o país e os portugueses, ou o momento em que agradeceu a todos os seus colaboradores (Teixeira dos Santos, alguém o viu? Sempre pensei que tinha sido um colaborador e uma peça fundamental do seu serviço ao país), ou ainda aquele em que falou do tempo que passará a ter para os filhos – foi uma lamechice de telenovela de segunda, para ver se puxava a lágrima dos portugueses. Mas, como sempre, José Sócrates não vive na realidade, e as lágrimas não se soltaram. Pelo contrário, o país respira de alívio.

Velas 28

Há dois dias

02/06/11

Outra Vez Camilo 2 (As Mulheres)

Decerto já observou, leitor, em senhoras de província um desembaraço bronco, um remexerem-se e bacharelarem-se despropositadamente, - desaires resultantes de lhes haverem dito que o pejo e o acanhamento são indícios de educação aldeã. Estes despejos improvisados sem delicadeza nem natural (...) abrem margem a suspeitas indecorosas; (...).
Camilo Castelo Branco, Novelas do Minho, Volume 1, Gracejos que Matam.

Camilo é um excelente fazedor de personagens. Molda-as com todas as nuances possíveis, dá-lhes espessura, volume, densidade e faz delas seres únicos e irrepetíveis. Esta dimensão, patente na sua capacidade de construir seres humanos (as suas personagens) completos, complexos e com alma, foi talvez uma das que mais me surpreendeu ao ler as Novelas do Minho, e faz dele, sem dúvida nem favor, um romancista de primeira linha. A forma como ele cria e molda as ‘suas’ personagens femininas (meninas, mulheres), não escapa a este perfeccionismo. Não há personagens-tipo, nem pré-fabricados, há sim personagens inigualáveis, e há sobretudo o seu olhar (enquanto narrador) que nunca perde uma 'nuance' e sempre cheio de ironia, ou de compaixão, ou simpatia, ou aversão, mas sem nunca lhe sentirmos preconceito.

Estes excertos são exemplos dessa fina observação que referi. Hoje, as senhoras de província, pertencem a outras ‘geografias’ que não a província tal como era no séc. XIX, os escrúpulos têm outros nomes, os rouxinóis que mantém acordados são tantas vezes virtuais. A matéria pode mudar, mas o gesto, o impulso, o estilo é o mesmo hoje ou no séc. XIX. Impossível não nos deleitarmos. Impossível contermos uma gargalhada.

(...) uma espécie de medo dos homens a obrigava a recuar o esteirão da soleira da janela. A timorata criatura tinha escrúpulos, e perguntava à mãe se os homens a veriam da rua. Isto, na verdade, era bonito em uma menina de vinte anos; mas, se a crítica pode superintender no foro íntimo de tão cândida alma, a mim parece-me que o escrúpulo é a chave que abre a porta por onde a inocência há-de escapar-se, tarde ou cedo. Se houvesse virtudes perfeitas, essas desconheceriam os escrúpulos que são de per si os prelúdios das imperfeições.
Camilo Castelo Branco, Novelas do Minho, Volume 3, A Viúva do Enforcado

Este bom homem, noite alta, (...) erguia-se para escutar-lhe a respiração da filha, e correr-lhe a vidraça nas noites quentes; porque ela, quando a aurora dealvava a curva do horizonte, estava ainda na janela a ouvir os últimos gorjeios dos rouxinóis. Contemplai uma vítima dos romances, ó pais e mães de famílias!
Camilo Castelo Branco, Novelas do Minho, Volume 2, Filho Natural

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