05/07/18

Bikini

O problema das migrações está na ordem do dia (da semana, do mês, do ano). O governo de Angela Merkel estremeceu, António Vitorino foi nomeado Director-Geral da Organização Internacional para as Migrações; e a estes factos mais recentes somam-se os recorrentes como as notícias de mortes no mediterrâneo ou Donald Trump e as suas decisões sobre imigrantes. O aumento de influência e, nalguns casos, a chegada ao poder dos partidos mais populistas e nacionalistas na Europa cujas mais polémicas decisões sobre imigração – que se resumem sempre num fecho de fronteiras - são um sintoma do mal estar de décadas das populações perante as migrações, as comunidades imigrantes e a sua (in)capacidade de integração. Abordar esta questão de forma séria, frontal e sem medos (venham eles do lado que vierem) não tem sido apanágio de Europa (EU) ou dos países que a compõem. É matéria em que os clichés se fazem fáceis e abundam. 

Em Portugal – um país periférico e pouco apetecível do ponto de vista de quem procura uma vida melhor na Europa (ou até asilo) - nós não temos sido confrontados com muitas das questões e muitos dos problemas que as migrações têm levantado há décadas noutros países europeus, como bem sabemos. Não somos confrontados numa base quotidiana e sem descanso com as divergências entre os modos de vida, entre os valores que hoje, como ontem e como amanhã, são parte integrante da nacionalidade, da cultura e da paisagem de cada comunidade. 

Faz um calor imenso em Londres e os parques onde a relva – inesperadamente - não é verde enchem-se de pessoas. Muitas mulheres e homens apanham sol estendidos numa toalha em fatos de banho e bikinis, e a 20 metros estão mulheres muçulmanas em pequenos grupos todas de preto tapadas. Digo tapadas porque não posso dizer vestidas, uma vez que não lhes vejo roupa, só mesmo um pano preto imenso que as cobre da cabeça aos pés - cara tapada só com uma fenda para os olhos. Dizem que é um niqab. Não são as primeiras que vejo, claro, mas – seria do calor? – fiquei surpreendida com a quantidade que desta vez eu vi na rua, e que foi bem superior à de outras vezes. 

Não há forma de me sentir confortável com esta visão, não há forma de aceitar esta tipo de paisagem urbana, não há forma de não sentir incómodo, repulsa e rejeição pela visão de mulheres todas tapadas, todas iguais. A cara de cada um é um dos principais factores identitários, e ao ser ‘abolida’, porque tapada, tapada reduz a mulher a uma condição de mercadoria que mais não é do que pertença de. Sem identidade não existimos, não somos quem somos; sem identidade não há dignidade, não há humanidade. Enquanto mulher sinto cada dia mais como um insulto e uma afronta, esta impotência que as sociedades democráticas, liberais e tolerantes que baseiam os seus valores (e legislação) no respeito pela dignidade de cada pessoa têm, e que permite que se viva tranquilamente este aniquilar do ser, esta indignidade de quem não pode/quer assumir a sua identidade que é aquilo que a torna única. 

Esta deveria ou poderia ter sido uma fronteira a não deixar que fosse ultrapassada. Em nome da tolerância pela cultura e costumes dos outros, permitimos a intolerância e fomos cegos quando outros valores opostos aos nossos se instalaram ao nosso lado e de forma insidiosa foram pondo em causa aqueles porque tanto lutámos enquanto civilização. 

There is no way I will ever be comfortable with the sight of niqabs alongside bikinis in the parks of London in warm summer days. Niqabs are not clothing, they are a piece of black cloth that hides whatever makes them an individual. By hiding their faces, their identity, their uniqueness, they became much more like a commodity than a human being. 

I find it hard to accept that societies that have at their core such values as democracy, the dignity of the human being, equality before the law, and the value of individuality, easily tolerate so many situations where women are deprived of their identity, their uniqueness.

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