31/05/09


















Hoje. Navios de guerra a abandonar o Tejo. (Clicar para aumentar)

Guerra e Paz 2

“Sim, o amor (pensava ele, de novo com toda a clareza), mas não aquele amor que ama por um qualquer mérito, com uma qualquer intenção ou por um qualquer motivo; mas aquele amor que experimentei pela primeira vez quando, moribundo, vi o meu inimigo e mesmo assim o amei. Experimentei aquele sentimento de amor que é a essência da alma e para o qual é desnecessário objecto. Ainda agora tenho em mim esse sentimento ditoso. Amar o próximo, amar o inimigo. Amar tudo é amar Deus em todas as Suas manifestações. É possível amar de amor humano um ser querido; mas apenas o amor divino torna possível amar o inimigo. Foi por isso que tiver tanta alegria quando senti que amava aquele homem. (...) Amando com amor humano pode passar-se do amor ao ódio; só o amor divino é constante. Nada, nem a morte o pode destruir. É a essência da alma. Ora quantas pessoas eu odiei na minha vida! E, entre todos não amava nem odiava ninguém mais do que a ela.”
(...)
Naquelas horas de solidão, sofrimento e delírio depois do ferimento, quanto mais pensava no princípio novo do amor eterno que se lhe revelava, mais renegava, sem se dar conta, a vida terrena. (...) e com mais perfeição eliminava a barreira terrível que, sem amor, se ergue entre a vida e a morte.
Lev Tolstói, Guerra e Paz

Do Amor. O amor tal como o Principe Andrei o descobre quando jaz ferido depois da batalha de Borodino, e que lhe é revelado na sua essência divina, para lá dos motivos, das pessoas, dos “afectos”, e por isso também para além da vida e da morte tornando ténue, na sua presença, a separação que se faz entre uma e outra. Ao ler Guerra e Paz é impossível não pensar em Platão e na dimensão existencial que está para lá da vida material e que encaixa tão bem na fé e misticismo que atravessam esta obra e moldam as suas personagens. O Principe Andrei, um aristocrata culto, orgulhoso, e bem formado, mas algo rígido e cínico e com uma família peculiar: um pai racionalista e uma irmã mística, é outra das personagens fascinantes do romance. Ao longo da sua vida, opções profissionais (se é que se pode dar este nome às carreiras desta aristocracia que vive dos rendimentos das imensas propriedades e dos servos que as trabalham), ferimentos de guerra, amores e desamores percebemos que se vai moldando e adaptando às descobertas que faz sobre si, sobre a sua resposta à vida que vai vivendo, sobre a evolução do seu íntimo. Aliás este é um romance voyerista, porque entra e vê dentro da alma das personagens, alma essa que é, quase só por si e pela sua essência universal, a personagem principal do romance. Nada nos é poupado dos dilemas, descobertas, contradições, fraquezas e revelações das personagens, e claro, ad descoberta da sua “alma”. Estas personagens tão ricas e densas são irresistíveis na sua humanidade e complexidade que, de repente – e pelos instantes que dura a nossa ligação com a obra - até parece que esquecemos outras personagens de outros romances cuja forma, ao olhar do alto deste cume literário e filosófico, se torna, em perspectiva, linear, plana e previsível.

29/05/09

Dias de Verão 11

Paul Gauguin (1848-1903)
Paysage de Bretagne. Le moulin David
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Do Escrutínio

Desde que nasceu que se tornou um sucesso de audiências e nunca mais deixou de se falar do Jornal Nacional 6ª. Porque persegue o Primeiro-ministro numa inaceitável caça ao Homem, porque pertence ao grupo dos que se dedicam à maledicência, ou porque Manuela Moura Guedes tem um estilo “irritante” e estridente, porque MMG é opinativa e agressiva, etc, etc. Uma coisa é certa, nenhuma televisão ou jornal faz um tão exaustivo e persistente trabalho de investigação ou mesmo de escrutínio. Só hoje soubemos – com a devida documentação que foi certamente encontrada fruto de trabalho de pesquisa da equipa do JN6 - da história do arquitecto do PS que, caso lhe fosse dado o projecto do Freeport, faria o processo avançar mais depressa; soubemos da contradição do PGR que diz uma coisa, mas que quando confrontado um pedido de cópia do ofício em que se regista o que ele afirma, já se contradiz; fomos confrontados com os pormenores, e a forma abrupta como terminou por não conseguir reunir provas, do processo disciplinar de que Lopes da Costa foi alvo no tempo de Fátima Felgueiras em que já aí houve “alegadas” pressões, e até vimos uma fotografia de um jornal local de um jantar que nem Lopes da Mota nem Fátima Felgueiras lembravam bem, em que estavam juntos e até fomos lembrados de como, apesar dos anúncios em contrário, o estado, pronto recebedor, continua a ser um péssimo pagador deixando empresas em situações muito difíceis. Percebemos pelo que ouvimos durante o Jornal nacional, e independentemente do estilo opinativo, algo impertinente e sempre provocatório da apresentadora que há por trás de cada peça e como seu suporte uma equipa séria que faz um exaustivo, e por isso incomodativo, trabalho de investigação. Este trabalho de investigação de ir aos locais, ver registos, procurar jornais velhos, ler processos, é a marca do JN6 que faz a diferença.

Não é o estilo da apresentadora que parece ser “bem” criticar, que faz a diferença, é a investigação, a procura da notícia e a persistência que tornam este jornal noticioso tão único em Portugal, onde quase nada diferencia um meio de comunicação de outro neste pântano informativo em que nos tornamos.


Preto no branco aqui. Outras grelhas semelhantes poderiam certamente ser feitas para Lopes da Mota e mesmo para Victor Constâncio.

27/05/09

Plataforma Contra a Obesidade 53

John William Hill (1812-1879)
Plums


Na SICN, Helena Roseta expôs calma e claramente alguns dos problemas deste executivo em lidar com a coisa pública – o caso em debate era a intervenção no Terreiro do Paço. Foi, creio que em seu nome e representando o movimento cidadãos por Lisboa, muito contundente e crítica em relação à atitude do executivo de José Sócrates perante a coisa pública. De forma muito articulada explicou como o executivo se comporta sempre como se fosse o dono, e não um executivo ao serviço do que é público Como ele com facilidade e naturalidade abdica, em nome do descerrar de uma lápide de inauguração, de qualquer concurso público que, mais transparente do que uma encomenda privada ou um ajuste directo, optimiza uma solução, pois permite uma escolha entre várias opções apresentadas. HR evitou a crítica directa ao projecto em causa, pois, como ela bem frisou, o problema essencial não é o projecto em si, mas a atitude do executivo que se pensando dono, se permite abdicar do concurso público, para ter a obra terminada a tempo de a poder inaugurar.

Da Maledicência

José Sócrates, de cada vez que fala da “maledicência” e a confunde com crítica, naquele seu habitual discurso em que mistura conceitos e exorciza o pessimismo e a crítica que não combatem a crise nem resolvem problema algum, prova uma vez atrás da outra que nada percebe sobre a democracia, nem sequer de um ponto de vista teórico.


26/05/09

Velas 16

Ontem. (Sagres)
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25/05/09

Guerra e Paz

Tudo o que lhe expôs Denissov era razoável e inteligente. Tudo o que lhe estava a dizer o general-inspector era ainda mais razoável e inteligente, mas era visível que Kutúzov desprezava os conhecimentos e a inteligência, e que estava na posse de alguma coisa que resolveria tudo – de qualquer outra coisa, independente dos conhecimentos e da inteligência. (...). Era evidente que Kutúsov desprezava a inteligência, os conhecimentos e até o sentimento de patriotismo que Deníssov manifestara, mas não os desprezava com a inteligência, o sentimento ou o conhecimento dele próprio (porque nem tentava manifestá-los), mas com qualquer outra coisa. Desprezava-os com a sua velhice e a sua experiência da vida. Uma decisão que Kutúsov tomou (motivada pelo relatório do general) dizia respeita às pilhagens cometidas pelas tropas russas. No final do relatório, o general-inspector apresentou a sua alteza sereníssima um papel, para que o assinasse, com vista à responsabilização dos comandantes militares por uma aveia ainda verde que os homens tinham cortado, em consequência da queixa de um proprietário.

Ouvido o caso, Kutúsov deu um estalido com os lábios e abanou a cabeça.

Para o fogão... lume com isso! E, meu caro, vou dizer-te de uma vez por todas: assuntos desses, deitá-los todos ao fogo. Que eles ceifem as sementeiras e queimem lenha à vontade. Eu não dou ordens para isso, nem o autorizo, mas também não posso puni-lo. Sem isso é impossível. Para cortar lenha, há sempre lascam que saltam. – Olhou mais uma vez para o papel. – Oh, a minúcia alemã! – disse, abanando a cabeça.
Lev Tolstói, Guerra e Paz

Kutúsov é, neste romance, apresentado como uma personagem fascinante e contraditória, tanto dado a algumas mundanidades e a pequenas vaidades e confortos, como senhor de uma esperteza e sabedoria profundas feitas da guerra, de negociações e da observação da natureza humana. Na sua velhice tem o hábito de se deixar adormecer nas importantes reuniões, nomeadamente quando da definição de estratégias para as batalhas, em que os mais jovens oficiais entusiasmados, cheios de energia e patriotismo e motivados por uma ambição de recompensas por mérito, tomam a palavra e mostram bons planos para acções. Kutusóv sabe que há uma força, uma inércia própria da actividade bélica que está para além de discursos inflamados e que assenta sobretudo na dinâmica própria da guerra e consequente esgotamento dessa dinâmica, da capacidade e do espírito bélico. A sua política de retirar, deixando o inimigo (os Franceses) avançar, expondo-os – a seu tempo - às suas próprias (franceses) fraquezas e limitações, foi amplamente contestada por muitas chefias militares, pois sem batalhas as medalhas de mérito e as promoções são mais difíceis de obter, sem batalhas o povo não sente que se lute pela pátria, sem batalhas não se expõe o orgulho de um povo, de um regimento. No entanto Kutúsov sabia que retirando e esperando se evitariam batalhas desnecessárias e sangrentas; Borodino foi a ilustração de uma batalha enorme em que houve grandes perdas e grande derramamento de sangue, sem claro vencedor e vencido, apesar de Kutúsov ter sentido que aí Napoleão começou o seu fim. Sabia que a seu tempo se conseguiria de forma eficaz expulsar um inimigo que inevitavelmente chegará ao esgotamento e ficará sem força. Não conseguiu contenção total, pois era difícil travar totalmente o movimento das tropas russas e de alguns grupos mais ousados que se envolveram em pequenas acções, mas o grosso do exército russo retirou evitando grandes banhos de sangue e deixando Moscovo cair nas mãos inimigas. Mas, a Rússia não era Moscovo, como Kutúsov bem sabia e Napoleão cedo percebeu e cedo retirou saindo da Rússia com um exército desfeito e desmoralizado.

Kutúsov na sua velhice e na sua sabedoria, sabia também o preço que há a pagar para se fazer e manter uma guerra. Não só um preço contabilizado em homens que se mantêm ou que se perdem, em bens destruídos e saqueados, em cidades e campos incendiados, em dinheiro, em provisões e material, mas também um preço moral. Que se as regras devem existir, nem sempre se podem cumprir. Ele sabe, por exemplo e como o excerto transcrito mostra, que sem pilhagens não há soldados, sem soldados não se faz a guerra de quem quer, de quem tem e de quem pode.


23/05/09

Velas 15

Há dois dias
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Da Natureza das "Coisas"

A ler José Pacheco Pereira no Público de hoje sobre o “falso” debate sobre a Europa, e do adormecimento perante o unanimismo.

(...) Todo este dinheiro atirado para cima de "acções de esclarecimento" nada tem de inocente. Contribui e muito para reforçar um falso debate, viciado à partida por ter um só lado. E um meio comunicacional já muito dependente de um aparente "consenso" europeu, que aliás reflecte o "consenso" político, ainda se torna mais pobre quando é manipulado por estas actividades. Na verdade, elas não são muito diferentes nos seus resultados, nas suas técnicas de "massagem do ego" (...) Não se trata de venialidade, mas de manipulação, e da moleza que vem da proximidade, do contacto, do grupismo, e, no fundo, da vaidade de se ter sido convidado e da vontade de responder à amabilidade do convidante. É um contrato invisível, mas é um contrato.

A propósito desta moleza não deixo de reparar como, de repente e bem visível no blogue Papa Myzena, os Passoscoelhistas se converteram (adaptaram, reconciliaram, querem lugares no parlamento, assessorias, nas consultorias, é mais uma questão de significado do que de significante....) ao mainstream do partido depois de todas as críticas e ataques a Manuela Ferreira Leite pelo que ela é, pelo que representa, pela forma de comunicar, pela forma de manter-se em silêncio quando nada tinha a dizer, pelas “gaffes” que tanto notaram, ridicularizaram e tanta visibilidade lhes deram, e pela escolha de Paulo Rangel para cabeça de lista às europeias. Eu sei que em tempo de guerra não se limpam armas, mas há algo que é difícil ignorar: por muito que o partido seja o mesmo e o sentido do voto seja o mesmo, a natureza das coisas não o é: isto é, as pessoas não o são. Passos Coelho (tal como José Sócrates) é de diferente natureza de Manuela Ferreira Leite. Mas parece que isso agora, já não conta.

21/05/09


Parece que o Estado este ano cobrou menos dois mil milhões de euros em impostos. Uma boa razão para avançar (ou justificar) com mais uma “medida” de combate à crise que, na sua aparente bondade social, dificilmente esconde a pura demagogia e oportunismo e o delírio fiscal em que vivemos. É um sem fim de medidas "anti-crise" que se sucedem a ritmo estonteante. Que seria deste governo sem a crise? A crise foi um pretexto fabuloso para tapar a incompetência, falta de trabalho e de seriedade deste executivo. O problema é que nós ficamos anestesiados com tal abundância e criatividade legislativa face da força impulsionadora e optimista do nosso líder, e só pondo a cabeça de fora é que vemos o estado degradado do país.

20/05/09

Ontem
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Elogio do Nada

Hoje é dia de Prova de Aferição de Matemática para os 4º e 6º anos de escolaridade. As provas não contam para a nota e, tal como aconteceu com a prova de Língua Portuguesa, esta de Matemática deverá também ser fácil. As “provas” não são “exames”, conceito aterrorizador para as criancinhas, (esta dança de vocábulos no mundo do ensino é espantosa), e as criancinhas não podem ser reprovadas, pois há que combater a discriminação e exclusão, altamente traumatizantes e desmotivadoras, e fazer testes fáceis para que nunca se premeie a excelência, dedicação, esforço e trabalho, e para que possamos ser todos cada vez mais iguais, mais banais, mais medíocres.

Pergunto-me, então, para que servem realmente estas provas, e qual o mérito – sobretudo para os alunos, claro – desta política de Provas de Aferição. São meios, nomeadamente financeiros, que se mobilizam para realizar estas provas que não servem para nada. Perdão, servem fabricar e dar “credibilidade” a umas estatísticas falaciosas sobre a qualidade do ensino em Portugal. Servem para a imagem, o verdadeiro interesse e a real obsessão deste governo PS. Dar a imagem de um Portugal melhor: lavar a fachada, esfregar a soleira da entrada, pintar a porta, o que está dentro pouco interessa.
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19/05/09



A “medida” de hoje (que combate a crise e contra o bota-abaixismo) com o respectivo “momento Chavez” televisivo, que pude ver, foi o anúncio da meta de 8000 camas de Cuidados Continuados já para 2009. Oxalá.


No Reino-Unido aconteceu por muito menos. O parlamento exigiu. Houve um escândalo, suspeitas conivências e demissões. Cá assobia-se para o ar, fazem-se “alegadas” pressões que num primeiro tempo os magistrados dizem que não que não, depois já é um nim, os políticos falam em cabalas e campanhas negras, os familiares dizem-se e contradizem-se. Não há respeito pelo eleitor talvez porque o eleitor não se dê ao respeito, não exija demissões e seriedade. Não há também nem honra nem vergonha na cara. Mas sobre isso já falei neste post. Hoje, Gabriel Silva no Blasfémias mostra do que se fala, traça um retrato e compara.

17/05/09

Coisas que se Podem Fazer ao Domingo 39

Alphonse Mucha (1860-1939), Auguste Seysses (1862-1946)
Femme aux lys

Colher lírios
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Vergonha na Cara

Diz António Barreto que “O Magistrado Lopes da Mota não deve sair do EUROJUST. Não deve suspender o seu cargo. Nem pedir a demissão. Nem ser demitido. Se a representação de um Estado deve traduzir a verdade, ele é o homem certo no lugar certo (...)Ele é o genuíno e fiel símbolo da justiça portuguesa”. Tem toda a razão, mas eu tenho vergonha que assim seja. Problema meu, eu sei, mas tenho vergonha – já nem falo de ética, de moral, só de vergonha - de Lopes da Mota, de Cândida de Almeida que não sabe estar calada, do “primo do Kung-Fu”, do primo do primo, enfim... calarei a minha lenga-lenga de satélites que gravitam à volta do poder e com “respeitinho” para com o poder, para não maçar ninguém. Eles não têm vergonha mas eu tenho por eles e tenho mais por eles não a terem do que por fazerem o que fazem. A vergonha genuina aparece pouco. Muitas vezes esconde-se a vergonha com humor desprendido, com inteligentes análises, com críticas acutilantes, com inflamada indignação, com protesto, mas no fim do dia fica o embaraço e a vergonha de sermos o que somos: um país pobre, sobretudo de espírito, um povo de brandos costumes que se acomoda à mediocridade que lhe permite ir ao café dizer mal de tudo e de todos. Brandos costumes da treta que imobilizam o cérebro e o corpo, que impedem um rasgo de genuína revolta e vergonha. Enchem-se as praias ou os shoppings, abstemo-nos nas eleições porque “não vale a pena” - dito com um suspiro de quem se habitua a um fado que não merece mas suporta com estoicismo. Ah, merecemos sim; merecemos cada um dos políticos que temos, cada uma das “elites” administrativas, financeiras, judiciárias e mediáticas que temos. Que importa Lopes da Mota, Pinho, o primo do Kung-Fu, o primo do primo, a mãe do primo do primo, o tio do primo do primo, o Freeport, as “alegadas” pressões. Tudo bem, tudo normal, ninguém se demite. Outros fizeram-no por muito menos cá em Portugal e no estrangeiro, mas nestes casos deste consulado Socrático essa questão nunca se coloca. Ninguém tem vergonha na cara.

Uma pergunta que fiz aqui, encontrou resposta aqui. Fantástico! Afinal existe mesmo uma “papa maizena”, tem receita e tudo e houve quem a tivesse comido. Alguns, claramente em excesso. Coisa de deixar más recordações


Pede-me Nelson Reprezas para mencionar séries televisivas, não percebi muito bem – nem procurei perceber, confesso - com base em que critério. Mas creio que seja que critério for andará sempre à volta da nossa experiência e gosto pessoal. Embora avessa a correntes blogosféricas, gostando de poucas e quebrando-as todas, este pedido revela-se um pretexto para escrever sobre algo de que gosto, e instantaneamente – mesmo antes de eu ter tempo para pensar, accionou a minha memória porque toda a vida gostei, e gosto de séries televisivas. Lembro tempos em que a semana funcionava em função de um determinado dia de semana em que a televisão (quando televisão era algo que não tinha mais do que dois canais, e até quando era a preto e branco) dava esta ou aquela série. Agradeço o DVD (e antes o VHS) que tornaram possível comprar alguns packs de séries completas (ou temporadas) antigas e recentes, que me permitem uma saudável e total alienação da realidade durante um fim-de-semana ou uns dias seguidos. Vi muitas séries, boas e menos boas - estas últimas são sobretudo muito marcadas por uma determinada época ou “moda” - mas há algumas que lembro com saudade pois marcaram a minha infância ou adolescência e remetem para um mundo diferente e para um momento de inocência quase rousseauniano. Só essa inocência permitia que gostássemos das séries que hoje não me apetece propriamente rever, no entanto fica a nostalgia dos momentos em que fui feliz a vê-las, fica a espécie de ternura pela recordação. Todas as séries que mais à frente menciono foram vistas, até fora de Portugal, e algumas vistas e revistas. Sei que com mais tempo a minha memória se avivaria e lembraria outras tantas. Opto por umas escolhas sobretudo nostálgicas, de séries de outras décadas e de outros mundos, à excepção do Dr. House. que está presente porque é a única que hoje recria um pouco o ritual de ver uma série “em directo”: é a única que me obriga, todas as semanas à segunda-feira no canal Fox, a repetir esse ritual que já é quase de outros tempos: sentar em frente à televisão quieta e parada. Outras séries actuais vejo-as normalmente em diferido falhando alguns episódios, ou vejo posteriormente em DVD se gostei particularmente.

Get Smart (Olho Vivo), Green Acres (Viver no Campo), Bewitched (Casei com uma Feiticeira), Gabriela Cravo e Canela, Upstairs, Downstairs (A Família Bellamy), Brideshead Revisited (Reviver o Passado em Brideshead), La Piovra (O Polvo), We’ll Meet Again, A Town Like Alice, The Jewel in the Crown (A Jóia da Coroa), Hill Sreet Blues (A Balada de Hill Street), The Muppet Show (Os Marretas), Blackadder, Twin Peaks, Yes, Minister e Dr. House.
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15/05/09


Depois de uma semana arredada da actualidade – tanto quanto nos é permitido, claro, e do blogue li agora no Público online esta notícia, só com exame psicológico será possível tirar ou revalidar a carta de condução, que me tranquilizou pois me demonstrou que afinal é verdade, não é só uma suspeita minha: o país caminha impávida e serenamente para o absurdo. Repito: absurdo. Já não falo da crise económica que o governo combate com medidas contra “bota-abaixismo”, do desemprego que se resolve com formações e parcerias inventadas em mesas de reunião, da segurança que sai à rua em força no dia a seguir a distúrbios, das “alegadas pressões” aos magistrados do caso Freeport em que José Sócrates é, alegadamente, suspeito, da “delação” de quem se incomoda com pressões; já não falo da Europa que não se discute, das eleições e do financiamento dos partidos, do PSD que sobe nas sondagens, das hesitações de Alegre, dos “momentos Chavez” do Primeiro-ministro que se sucedem para as televisões a um ritmo diário iludindo-nos com “medidas”, da crescente presença mediática e com sucesso de Paulo Rangel (aquela escolha duvidosa e tão criticável – e criticada - de Manuela Ferreira Leite), do recente silêncio de Pedro Passos Coelho.

O país caminha para o absurdo porque ninguém pára para pensar, porque não se deixa que o tempo seja bom conselheiro, porque se perdeu o norte, porque não se distingue o essencial do acessório, o que é norma do que deve ser excepção, porque na ânsia de se querer ser politicamente correcto se legisla de qualquer maneira sem olhar as consequências, porque não se preza a liberdade individual e se permite que o estado nos vá, a pouco e pouco, estreitando numa camisa de forças. Um destes dias nem estrebuchar podemos. Psicólogo para tirar a carta? E para ser político e Primeiro-ministro? E para ser médico? E para ser gestor de um Banco? E para ser magistrado? E para ser professor? E para ter filhos? E para casar (homo ou hetero)? E para comprar casa?

Está tudo doido?
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Dando Excessivamente Sobre o Mar 46

Odile Redon (1840-1916)
Rocks on the Beach
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08/05/09

Diferenças

Sobre a viagem do Papa ao Médio oriente

Bento XVI não deixará de insistir num facto que o preocupa: o êxodo dos cristãos do Médio Oriente. Em quatro décadas, só em Israel e na Palestina, eles passaram de vinte para dois por cento numa população de nove milhões.
(Público, Ed. Impressa)

Este facto é uma das mais significativas imagens – e de difícil contestação - sobre a gradual radicalização das sociedades islâmicas do Médio Oriente ao longo das últimas quatro ou cinco décadas. Intolerância, violência, abuso, pressões várias têm sido e são o quotidiano das minorias cristãs (sobretudo católicas) nos países islâmicos. Em contra-partida, no ocidente, o acesso ao estado providência (sobretudo na Europa), o respeito pela diferença, a integração – com maior sucesso nos EUA – foi sendo, mesmo que por vezes de forma controversa ou pontualmente pouco sucedida, a política dos diferentes governos. Enquanto que no ocidente as mesquitas aumentam, as igrejas no Médio Oriente estão em vias de extinção.
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06/05/09

Plataforma contra a Obesidade 52

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Bacon Sandwich

(...)
If everyone improved their lifestyle just a bit, then the benefits to the overall health of the nation would be large but each individual would not notice the difference. An inspired epidemiologist, Geoffrey Rose, called this the Prevention Paradox and we see it being played out again and again.

That is why it is understandable that attempts to create these shifts in behaviour by exhorting people to change tend to fail - and make them anxious and guilty. It explains the current call for society-wide actions such as minimum alcohol pricing, and enthusiasm for 'nudging' people towards better behaviour. When you find the muesli at the front of the breakfast counter, and the bacon sandwiches in an unmarked gloomy corner of the canteen, you know you're being nudged.

So as you reach for your yum, perhaps sometimes pause a moment and realise that you are taking a gamble on the yuk occurring, but that it may be a risk worth taking.

Uma perspectiva individualista e desapaixonada sobre os prazeres e o risco numa prosa inspiradora.

Adenda: Não é bacon sandwich, mas “tem tudo a ver” (para usar uma expressão modernaça) na ânsia de regular os costumes; neste caso “regular a cama ou o vão de escada”. Uma outra prosa inspirada, desta vez da pluma de João Gonçalves.
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Ontem
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Lantejoulas e Tutus

Esta notícia chamou a minha atenção. Já várias vezes me tinha perguntado quando é que a modalidade de natação sincronizada se alargaria aos homens e como. Sou contra qualquer tipo de discriminação, mas também sou céptica em relação às proclamações de igualdade a propósito de tudo e de nada. Rapaz não é igual a rapariga por muitas voltas que se tentem dar. Devem ter igualdade de oportunidades quer no ensino da matemática, como na entrada para as Forças Armadas ou na prática de natação sincronizada. O que já me parece forçada é a ideia de que um rapaz para que pratique esta modalidade desportiva o tenha que fazer como as mulheres o fazem: pinça no nariz, maquilhagem, fatos brilhantes e com lantejoulas. Nem tão pouco consigo ver o interesse desportivo e estético de um rapaz em reproduzir os movimentos que as raparigas fazem e que são sobretudo adaptados à anatomia feminina. Na dança clássica, Ballet, os homens não usam tutu, não fazem pontas, nem fazem o mesmo trabalho de pés que as mulheres. Fazem outros em que se destacam: piruetas, saltos. Também é assim noutras modalidades desportivas mesmo quando há equipes mistas. No atletismo em competição, e apesar de fazerem as mesmas modalidades, há a separação entre homens e mulheres. Abrir a natação sincronizada aos homens não passa por travesti-los e pô-los a fazer os mesmos movimentos que as raparigas fazem, passa sim por adaptar e explorar as possibilidades da modalidade à anatomia masculina. Talvez nadar com as raparigas e como as raparigas não seja a melhor forma de persuadir a federação desportiva a alargar a modalidade a rapazes. Parece que hoje, no nosso mundo, a ânsia igualitária não conhece limites.

05/05/09

A deselegância e o ressabiamento político unidos num comentário do ministro do Allgarve contra Paulo Rangel. Mais a mais em pura dissonância com o espírito de Plataforma contra a Obesidade engendrada pelo seu – nosso – Primeiro-ministro. Senhor Ministro, deixe as papas maizena (que é isso? O Senhor algum dia as comeu?) eu aconselho-o trocá-las por umas sopas de legumes.
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Dias de Verão 10

Pablo Picasso
Sleaping Peasants
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Sair de Cena 5

Dias Loureiro continua, vítima das suspeitas que pesam sobre si, a arrastar-se penosa e desconfortavelmente pelos corredores do regime. Claro que ele pode teimar em continuar este percurso de penitente e obrigado, nada que outros nos dias de hoje não o façam com a diferença de ostentarem a arrogância dos fariseus e a determinação dos heróis vencedores. Para não continuar a colocar o Presidente da República numa situação inusitada e desconfortável, para lhe (ao PR) devolver a liberdade que está comprometida, mas sobretudo por ele, pelo que ainda resta de dignidade da sua pessoa, era bem melhor que pedisse para abandonar o Conselho de Estado. Já deixou passar tempo demais. Será que não vê?


04/05/09


Mais um cartão amarelo a MFL. O PS lidera a intenção de voto para as legislativas nesta última sondagem, apesar de uma subida do PSD.
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Obrigada ao Pedro Correia pela referência. Como sempre, estas correntes deixam-me sem jeito.
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