18/03/12

Shame


Gosto sempre de ver filmes de e para adultos, por isso depois de Hugo (um filme muito razoável apesar de eu dispensar a cena ‘óculos 3D’ e de não sentir nenhum tipo de necessidade 3D), e de War Horse (uma americanada bem arranjadinha que não ficará para a história com imagens bonitas e música previsível) é com prazer que me sento para ver Shame. Sinto que é cada vez mais difícil ter manifestações culturais (literatura, cinema, artes plásticas...) exclusivamente para adultos, sinto que o mainstream cultural é permeável e tende a espelhar esse conceito que é a ‘juventude’ ou a ‘adolescência’. Esta seria uma longa conversa.

Como dizia, gosto de filmes para adultos, música para adultos, livros para adultos e Shame é um excelente filme, realizado com maturidade, mestria e sem cair em tentações de facilidade formal ou narrativa para apelar a um público mais amplo. Saí do cinema como se tivesse levado um murro no estômago – tal como saí, em seu tempo, no fim de Este Pais não é Para Velhos, outro filme excelente e para adultos. Há uma violência nos dois filmes, mais explícita em Este Pais não é Para Velhos e mais gélida crueza em Shame (quase todo o filme é num tom azul acinzentado), que incomoda e perturba. Eles fazem, com inegável mestria, uma viagem pelos limites da solidão, da degradação e do aviltamento da natureza humana. Essas viagens que nós leitores/espectadores fazemos são difíceis e não são confortáveis. Não saio da sala do cinema reconciliada com a natureza humana; preciso de algum tempo para respirar. Já dei conta dessa sensação ambivalente quando escrevi aqui sobre o livro A Grande Arte de Ruben Fonseca. O querer ler sem ter que ler, o querer ver sem ter que ver, apesar de já muito pouco me surpreender na natureza humana. Sei, no entanto, que não resisto a ir até ao fim quando a obra em causa (filme, romance) tem inegável qualidade. 

Shame tem inegável qualidade. Do do ponto de vista formal que é também um filme irrepreensível (imagens, música). Michael Fassbender é um daqueles actores de quem muito esperamos e Carey Mulligan não desilude e é protagonista de um dos momentos mais intensos e incómodos do filme quando actua  perante o irmão (e restante público). Recomendado a adultos com sons de alerta para almas mais sensíveis...

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