26/11/07

Rio das Flores 1


Confesso-me uma desencantada da literatura portuguesa actual. A minha fraqueza literária são os romances e numa perspectiva quase de “quanto maior, melhor”. Não gosto de romances light, nem me entusiasmo muito pelas novelas e pequenos romances tão aclamadas mas incompreensíveis e em que nada acontece, que enchem as livrarias. Por isso, compro e leio pouco do que cá se faz. Gosto da tradição do romance do séc. XIX em que se conta uma história que se alonga no espaço e no tempo e muitas pequenas histórias numa coerência e riqueza narrativa que conta com belas e densas personagens, dilemas, uma família ou um grupo de pertença, bem como uma sociedade inevitavelmente em mudança e cujos “sinais dos tempos” são pano de fundo a dar espessura, e claro, não esqueço a necessidade de uma boa uma escrita e um estilo que fazem do romance uma peça literária. Perante este meu gosto por grandes romances, foi sempre com expectativa elevada que li mal sairam, quer o Equador, quer o Rio das Flores de Miguel Sousa Tavares (MST) tal como referi aqui. Já há uns dias que acabei a leitura de Rio das Flores. Em termos gerais posso dizer que é um livro interessante e que se lê bem, com uma escrita fluida que caracteriza o autor, o que só por si é indiscutivelmente um mérito no meio de tanta publicação ilegível e presunçosa ou oca e banal que enche os escaparates das livrarias. O problema é que, elevando um pouco o grau de exigência, eu esperava mais e melhor, e direi porquê. É uma visão e opinião pessoal baseada na minha leitura da obra, uma leitura que faço por prazer e não por profissão. Não ilustrarei com excertos – como tenho feito aqui no blogue com outros romances lidos - porque o ritmo de leitura é acelerado e porque foram poucos e pouco significativos os momentos que destaquei e que me chamassem particularmente a atenção, e percebi-os irrelevantes para ilustrar as minhas opiniões. Sei que não faltam exemplos, mas não vou ler o livro uma segunda vez. Ficam por isso impressões com carácter mais genérico.

Apesar da receita mágica – já tão glosada pelos críticos - de exotismo e sexo, infalível a seduzir os leitores no seu anterior romance, Equador, creio que este (Equador) tem uma certa frescura e alguma inocência (por ser um primeiro romance?), lê-se de um fôlego só, e de ficamos presos ao desenrolar do enredo ou ao ambiente húmido de S. Tomé, esquecendo alguma banalidade estilística e previsibilidade, entretidos que estamos na espiral da narrativa. Isto é um mérito em Portugal onde normalmente - porque há excepções, se contam mal histórias. Rio das Flores é mais ambicioso, mais elaborado, mais presumido, mais premeditado, mais intencional, elevando a fasquia. Nas primeiras páginas nota-se logo esta característica, o que mais facilmente expõe o livro ao desapontamento de um leitor um pouco mais exigente.

Fica-me a sensação de um romance híbrido que não é nem uma coisa nem outra, antes pelo contrário. Não é suficientemente leve nem tem um enredo simples e básico para se ler como um romance “light”, nem é suficientemente estruturado e sério para ser um romance histórico, nem tão pouco é cuidado, sólido e elaborado, nomeadamente a nível das personagens e consequentemente no retrato da sociedade para ser considerado um bom romance familiar na boa tradição literária. MST foi demasiado ambicioso: apostou em todas as frentes, levou-se demasiado a sério enquanto romancista histórico, e o resultado não é tão brilhante como gostaria, diria até que mais baço do que o seu romance anterior.

(Continua)

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