20/06/10

Deixem-nos em Paz

Pior do que a vaidade emproada que Saramago ostentava, só mesmo o deslumbre provinciano que quem, de cada vez que ele perorava sobre o mundo em geral ou sobre si em particular, lhe colocava um microfone à frente. Ou as horas a fio nas televisões (numa inclemente guerra com o rival futebol deixando pouco espaço para a realidade no país e no mundo), as capas dos jornais de ontem, hoje e quem sabe amanhã, o unanimismo, o luto nacional decretado, o Nobel lembrado num constante exercício requentado de memória, as faixas pretas autorizadas pela FIFA nos jogadores portugueses (que certamente conhecem e apreciam a obra do autor) no jogo de amanhã, o pseudo-escândalo por Cavaco Silva não ir ao funeral, ou até, ouso, a discutível decisão, que no entanto ninguém põe em causa, de disponibilizar um avião da Força Aérea para trazer corpo do escritor para Portugal. Um ambiente a cheirar o patético, o ridículo, o pequenino. Que fiquem os livros - ia dizer para quem os quiser ler, mas nem isso hoje se pode dizer da obra de Saramago, pois no secundário ele tem sido há anos leitura politicamente correcta e obrigatória (outro assunto que mereceria ser discutido) - mas deixem-nos em paz.

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