Já lá vão 3 ou 4 dias de polémica (ver aqui). Boris Johnson, o ex-ministro de Theresa May e conhecido Brexiteer, chamou as coisas pelos nomes, e não falta quem não se conforme e peça que ele se desculpe. Disse que as mulheres de burqa pareciam caixas de correio - e foi generoso, as caixas de correio, pelo menos as tradicionais inglesas, são bem mais coloridas e alegres do que as burqas - e a ladrões de bancos, e aqui também foi generoso, os ladrões de bancos são normalmente mais elegantes e raramente se cobrem com um pedação de tecido que impeça os movimentos. A Primeira-ministra já se demarcou dele e acha que ele se deveria desculpar, mas - independentemente da minha opinião sobre BJ - realmente não percebo de que terá de se desculpar, nem tão pouco creio que se deva desculpar. Parecem? Boris Johnson acha que sim, e então? Ladrões de bancos, só mostram os olhos, pois ocultam a identidade. Caixas de correio são blocos cuja marca identitária é uma fresta por onde deitar as cartas. Não parece tão descabido, nem tão tonto assim. É ofensivo? É o que é! (Falei sobre isso aqui) Mais uma vez, a liberdade de expressão (não difamou ninguém, não apelou ao ódio ...) a ser posta em causa.
Mais uma vez a nossa sociedade a não olhar a realidade de frente. Quando Theresa May diz que as mulheres são livres de se vestirem como querem, ele tem razão, eu também estou de acordo, e visto-me como quero, e aguento as opções de indumentária das outras mulheres e dos outros homens. Mas essa não é a questão, pois as mulheres com burqa não estão vestidas, estão cobertas; as suas roupas estão por baixo de um pano preto que as oculta totalmente e que lhes rouba identidade e forma, tornando-as, é bom lembrar que é esse o objectivo da burqa, invisíveis. Enquanto se achar que o uso da burqa é uma peça de roupa como os jeans, perpetua-se a falácia do exercício da liberdade da mulher em “se vestir como quer”, continua-se a evitar enfrentar o problema e a apenas se olhar para a superfície das coisas. A Dinamarca e os países que proíbem o uso de burqa, e de outros trajes que ocultem a identidade, em espaços públicos, estão certos. Mais uma vez a linguagem (na forma das frases de BJ) a ser punida, por não ter branqueado e ‘contornado’ a realidade.
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, (...) E, afora este mudar-se cada dia, Outra mudança faz de mor espanto: Que não se muda já como soía.
09/08/18
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