O mundo maioritariamente rural de Camilo nas Novelas do Minho não é só habitado por mulheres e, da mesma forma que Camilo cria personagens femininas densas e complexas, também o faz com as personagens masculinas. Os homens não escapam à lupa tantas vezes irónica (repito-me) de Camilo que aumenta alguns dos seus traços ao ponto de quase desenhar caricaturas.
Assim mesmo, o pedreiro, se tinha muitas maldades de avarento, possuía também algumas belas qualidades de pai; e uma, digna de bastante memória, é que, tendo ele em casa arsénico para matar ratos, não o administrou ao filho.
Camilo Castelo Branco, As Novelas do Minho, Volume 1, A Morgada de Romariz
Quando entraram no quinteiro, saía o lavrador da adega, onde pela terceira vez fora matar o bicho, aquela hidra de Lerna que botava cabeças todo o santo dia no bucho hercúleo de João da Lage.
Camilo Castelo Branco, As Novelas do Minho, Volume 2, Maria Moisés
Nestes dois excertos encontramos exemplos do lavrador, sem instrução ou cultura, que trabalha, melhor ou pior e que, melhor ou pior, vai sustentando a família. É muitas vezes bronco, às vezes bruto. Mas há mais...
Camilo perdoa as fraquezas do coração e da paixão e observa os apaixonados, homens e mulheres, sem preconceito e até com simpatia. Mas mostra nas novelas pouca compaixão pelas suas personagens masculinas quando elas, cegas pela ambição se deixam guiar por motivos mercenários, ou quando, por imaturidade, leviandade e prepotência, se mostram inconsequentes e irresponsáveis nos seus actos.
Corridos dois anos de vida bem comportada, foi admitido em uma sociedade de carvoaria de sobro, por onde lhe seria possível readquirir os bens esbanjados: mas, apenas a fortuna lhe sorriu, a sua índole brava sopeada pela pobreza, partiu as algemas, e tornou às antigas proezas e ribaldarias com o femeaço.
Camilo Castelo Branco, As Novelas do Minho, Volume 3, O Degredado
Ainda assim o estreme espírito português, por mais que o afiem e agucem, é sempre rombo e lerdo: não se emancipa da velha escola das farças: é chalaça.
Camilo Castelo Branco, As Novelas do Minho, Volume 1, Gracejos que Matam
Neste mosaico de personagens que, para facilitar a feitura destas notas, tentei ‘categorizar’ há um tipo omnipresente que não podemos esquecer: o fidalgo.
Um dos mancebos mais completos por património, nascimento e gentileza, no concelho de Celorico era o fidalgo de Agilde (...). Se eu tivesse de ir, ao arrepio, na peugada genealógica deste sujeito, encontrava-me com o macaco de Darwin. É família muito antiga a dos Marramaques, - são anteriores à história e talvez aos macacos. E, se me não falha a conta dos avós apurados nesta linhagem, o dilúvio universal está desmentido.
Camilo Castelo Branco, As Novelas do Minho, Volume 2, O Filho Natural
Camilo tem especial afecto pelos fidalgos, mesmo quando é trocista, sarcástico, implacável e mesmo quando lhes descobre – e não perdoa, literariamente falando, claro - más intenções, maus instintos, maus fígados. Camilo gosta e demora-se a explicar genealogias e pertenças (as terras, os solares) sem que detalhe algum falte ao leitor. Esta parcialidade pela fidalguia de província e conservadora (o contacto destes fidalgos com as cidades, sobretudo Lisboa, é sempre interessante, quando não divertido) e o cuidado com que conta a história das famílias e locais são um dos sinais da índole conservadora de Camilo Castelo Branco.