Leio os jornais online sobre a reforma administrativa do território e fico sem perceber nada. 'Não perceber nada' começa a ser uma constante no contexto político dos anos recentes. Não percebia nada com José Sócrates, e o que percebia não gostava, e continuo ainda mais baralhada e confusa com este governo. No entanto José Sócrates tinha a “virtude”, do ponto de vista de quem quer perceber, e só, da sua determinação e teimosia. Não tinha uma ideia política consistente e sólida do que queria para o país, sobrava-lhe ambição e a dita determinação que se concretizava no anúncio de medidas, avulsas e díspares dia sim dia não. Percebíamos as medidas, percebíamos a intenção (explícita ou implícita), mesmo quando discordávamos – eu discordava, zangada e indignadamente, quase sempre, como qualquer passar de olhos pelos arquivos deste blogue confirma.
Este governo consegue ser ainda mais confuso: tem um discurso redondo e parafraseando Marcelo Rebelo de Sousa, muito explicativo. Também não tem uma ideia política nem tão pouco uma visão com um mínimo de solidez para um país que cada vez mais se percebe que não conhece. As intenções do poder político, essas, continuam a perceber-se com demasiada facilidade, e as medidas não podiam ser mais confusas. Como referi: não percebo nada.
Vejamos:
Que é isso de “reorganização administrativa do território das freguesias”? Pode-se fazer isso sem ter as autarquias em consideração? Que reorganização administrativa começa a ser feita ‘por baixo’ em vez de ser feita ‘por cima’? Porque é que não há um projecto concreto (e não umas ideias confusas atiradas para a comunicação social) de reorganização administrativa global do território em vez de um projecto para freguesias e outro para autarquias. Porque é que se lêem títulos díspares e incoerentes nos jornais?
Ou:
E já agora a propósito destas ‘agregações’ de autarquias, porque é que, de repente, se fala de agrupar a autarquia do Porto e de Vila Nova de Gaia na comunicação social? Anda a Comunicação Social, ou outros políticos com aspirações e ambições a fazer o frete a Luís Filipe Menezes? Quem nasceu e conhece o Porto sabe que o Porto é a margem norte do Douro e Gaia a margem sul do Douro, duas realidades tão díspares que espelham géneses e tradições que pouco se tocaram e que só a ignorância (ou outras agendas) que não as do Porto e de Gaia, pode pensá-las semelhantes. O Porto é urbano e burguês. Em Gaia há ainda redutos de agricultura, há um feeling de província, há freguesias pesqueiras, há praia e há zonas residenciais de qualidade. Se o turismo recente tem contribuído para uma maior aproximação das freguesias na parte em que quase se tocam – o Douro – esse tocar é só isso mesmo, nada mais.
Talvez não fosse má ideia lembrar os fazedores destas ideias sem sentido que Porto e Gaia não são propriamente Paris com a sua Rive Droite e Rive Gauche, nem Londres atravessada pelo Tamisa ou Buda e Peste poeticamente separadas pelo Danúbio. Enxerguem-se, por favor!