16/12/12

Paternalismos

Quando disse aqui que achava que se perdia demasiado tempo a discutir Isabel Jonet, não fazia a mínima ideia do tempo que se iria ainda ‘perder’. Et pour cause; Isabel Jonet em período que requeria alguma descrição e ponderação nas palavras, por causa do turbilhão gerado pela sua entrevista televisiva, reincidiu, não soube ser discreta nem tão pouco estar calada. Sobre a polémica do que ela disse a propósito da caridade e do estado social faço minhas as palavras de JPP aqui. Não são, no entanto as suas palavras e polémica por elas gerada que me levam a escrever este post, mas sim a reacção de comentadores, colunistas, bloggers conotados com a direita, normalmente críticos, lúcidos, inteligentes, contundentes e pouco dados a reacções ‘grupais’. 

Nada como um debate mais acesso, para trazer ao de cima uma das características que mais abomino na direita, e que tem raízes fortes no catolicismo tal como vivido durante tantos séculos e que, infelizmente, ainda o é nalguns sectores: o paternalismo. Num debate que pode ser sobre o aborto, ou sobre a pobreza, ou outro tema de ordem moral, mais cedo ou mais tarde a “direita” acaba por ceder ao paternalismo. Senão vejamos o que diz hoje no Público Vasco Pulido Valente, um colunista crítico, mordaz, cínico, pouco dado a pensar pela cabeça de um ‘grupo’ ou da ‘direita’, a quem dificilmente colamos a etiqueta de paternalista: 

(…) Isabel Jonet, (…) é uma mulher estimável que, de repente, se viu metida no meio de um jornalismo espertalhão. Não sendo nem moralista, nem teóloga, nem política, falava com a maior inocência sobre si e o seu papel no Banco Alimentar, não lhe ocorrendo que se podia meter num sarilho ou suscitar uma polémica a cada palavra. Atravessou este pequeno tumulto com dignidade e boa fé. (No Público)

Para além de uns radicais de esquerda que questionam a boa fé de IJ ou o mérito social do seu trabalho no Banco Alimentar, vi apenas e exclusivamente ela ser criticado pelo que disse e pela oportunidade do que disse no contexto actual, dando às suas palavras a importância que elas merecem. Sim, IJ é uma mulher relevante no contexto da nossa sociedade, ainda mais em tempos austeros e difíceis. O que ela diz é relevante, e ela sabe-o certamente. Ter vindo a público novamente com explicações e declarações (entrevista ao jornal "i"), foi uma opção sua, certamente tomada de forma responsável como mulher responsável que parece ser. Declará-la vítima de “um jornalismo espertalhão”, e declará-la “inocente” ao falar sobre si e o seu papel no Banco Alimentar, é passar um atestado de imbecilidade a Isabel Jonet e menorizá-la enquanto pessoa e enquanto figura pública e de relevo na nossa sociedade. Ser condescendente e paternalista (machista também?) para com IJ e para com o que diz, é sobretudo desrespeitar o significado do que ela diz, desrespeitando-a também, ou desprezar o que diz ("não sendo moralista, nem teólogo, nem política", como se isso fosse condição para emitir opiniões), não lhe atribuindo importância ou relevo especial. Ser condescendente e paternalista é também interpretar livremente as intenções das suas entrevistas e das suas palavras (“não lhe ocorreu que se poderia meter num sarilho”, etc). 

Falar ou não, ceder ou não à tentação de se (re)explicar em entrevistas, é um direito que assiste a IJ, e tal direito deve ser olhado com respeito, nomeadamente dando às suas palavras todo o significado que as palavras têm. Sem mais. Argumentos do género ‘ela não tem jeito para dizer as coisas’, ou ‘ela não sabia no que se ia meter’, só a diminuem. Criticá-la pelo que ela diz não é menorizá-la, justificá-la com paternalismo, é. E é o que a ‘direita’ não se cansa de fazer: justificá-la...

Como se Isabel Jonet precisasse.

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