15/06/12

Pescar Salmão



Depois de um filme pesado, (no sentido de indigesto, e não no sentido de profundo), monocromático, e em que os excessos de caracterização das personagens (porque não arranjam actores mais velhos?) se impõem a tudo o resto, soube-me bem ir pescar salmão no Iémen, um filme que se revelou melhor do que previa, em oposição ao J.Edgar, de Clint Eastwood que me aborreceu seriamente. Devem-se contar nos dedos das mãos os filmes de Clint Eastwood de que não gostei, e este é um deles. 

Salmon Fishing in the Yemen está longe de ser um grande filme, nem será sequer a comedia do ano, mas não me decepcionou e gostei da forma como todo ele está pontuado por várias camadas de ironia. Kristin Scott Thomas, uma actriz que nunca desilude, dá corpo a uma assessora de imprensa do primeiro-ministro, muito esforçada, muito eficiente, muito actual - uma verdadeira perita na manipulação dos media: cria os acontecimentos, fabrica imagens e só pensa em termos do que é que o primeiro-ministro precisa para as primeira páginas dos jornais: uns dias que falem dele, outros que não falem dele. Nada que não conheçamos, mas sempre divertido de ver. Deparamo-nos também com a nostalgia de um (o?) império e do colonizador, com o privilégio e a abundância dos recursos que cabe à personagem que, fosse a História um fluir simples, unidimensional e sem desvios e a Política uma ciência binomial, deveria sentir os males do (ex)colonizado. Ewan McGregor (com o seu irresistível sotaque escocês) é a personagem que, tendo bebido da cultura ‘do império’ e tendo uma formação académica superior, não é mais do que o retrato de hoje de uma classe-média desiludida e desinspirada em sem ‘graça’. Ele vive acomodado num presente feito de rotina e em que o cepticismo é refúgio. Ao longo do filme esta personagem desajeitada, nunca deixa de nos cativar. 

Mas há mais: personagens, situações, paisagens, nada muito complicado, nada que exija muito esforço, nada que traumatize. Trata-se de um filme simples, despretensioso e simpático, eficaz a fazer sorrir, e feito para se ver ‘em família’. Ainda bem que o fui ver por causa do título e sem ter tido vontade de procurar mais informação sobre ele; tivesse eu feito isso, e tivesse eu percebido quem era o realizador, (já vi pelo menos duas chachadas realizadas por ele) provavelmente não teria ido pescar salmão no Iemen.

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